segunda-feira, 15 de agosto de 2011

azul

Profundo. Forte. Carregado. Límpido. Cristalino. Vibrante...







Ainda antes de chegar, já a côr me entrava pelos olhos dentro, vista do alto.

E enquanto a luz do dia acordava de mansinho e se espreguiçava no horizonte, era o azul que me prendia o olhar e me perdia na sua imensidão.

 


Cada vez que mergulho nele, afogam-se os medos e os desassossegos. Desaparecem as preocupações e desfazem-se as dúvidas.
Tudo se torna claro... fácil.
Fica-me a tranquilidade e a paz...


Por isso, perdoem-me a escassez de palavras e o devaneio monocromático que, hoje partilho...


Azul...


... eléctrico

... escuro

... límpido

... cristalino

... curioso




... puro

... ao fundo

... vivo

... sentido






terça-feira, 31 de maio de 2011

Zen

Quando era pequeno as festas de anos eram, no meu entender simples de criança, uma oportunidade de receber presentes.

Olhando para trás, hoje, especialmente depois de ter passado já 3 meses (não é tempo nenhum, bem sei) nesta ilha tão pequenina e remota, onde nem a televisão liguei ainda uma vez que fosse, dou conta que como "ocidentais" (que a geografia é relativa), o materialismo consumista nos é incutido dia após dia, desde pequeninos.

No meu tempo (hoje posso usar expressões destas...) eram os Legos, os Playmobil, os carrinhos, os soldadinhos e berlindes, depois o Zx Spectrum e os jogos de cassete... A bicicleta, os ténis de marca e tantas outras bugigangas que nos enchem os cestos de brinquedos e recordações da nossa infância, cheios de coisas que mais tarde se transformam em caixotes esquecidos empilhados na arrecadação e garagem.

Hoje, crescido e já um "homenzinho" (nas palavras do meu irmão) não me lembro dos Legos todos que tive, dos bonecos que tive (excepto alguns que eram companheiros inseparáveis), dos jogos todos, dos ténis, dos carrinhos, etc.

Lembro-me sim, dos passeios de bicicleta com o meu irmão e amigos, na barragem, das pescarias ao lado do meu avô e do meu pai, das esfoladelas nos joelhos e arranhões tratados com beijinhos carinhosos pela minha mãe, de acordar cedo para amassar pão com a minha avó. Lembro-me das corridas doidas, dos trambolhões, das mil e uma coisa que inventamos para fazer asneiras com os meus primos, dos jogos de escondidas e apanhada com os companheiros de recreio...
Lembro-me das árvores que trepei.
Lembro-me dos desenhos que fazia na escola.
Lembro-me do sorriso "Cândido" da minha professora primária, dos seus cabelos grisalhos e do olhar ríspido que conseguia fazer quando não nos portávamos bem. Lembro-me das únicas reguadas (merecidas) que foram dadas em 4 anos de escola primária naquela turma - a mim, claro!
Lembro das birras, das fitas, das palmadas, para mim completamente injustas na altura e que, lado a lado com tantos outros exemplos bons, tiveram o condão de, bem ou mal (julgarão vocês), me tornarem na pessoa que sou hoje.

Lembro-me das guerras de almofadas com o meu irmão. Lembro-me de partir a cabeça e da lasca que deixei na ombreira de mármore da porta do meu avô.
Lembro-me das brigas e implicações com o meu irmão. Lembro-me de partir pratos e copos.

Lembro-me das viagens de carro que me fizeram ganhar o gosto irrequieto por conhecer mais para além da minha porta e das músicas que ouvia no caminho e que me despertaram este amor que tenho pela música.


Lembro-me dos livros que me transportavam em sonhos acordados, para mundos mágicos e reais ao mesmo tempo. Ainda hoje têm esse efeito em mim.


Lembro-me dos ataques de parvoíce em família. Dos risos que se metem debaixo da pele e nos fazem tremer o corpo em gargalhadas.

Lembro-me dos amigos que fiz e tenho e dos momentos enriquecedores e experiências que tive a sorte de partilharem comigo.
Dos jantares, dos picnics, da parvoeira pegada que se gera à volta de uma mesa de comida boa.

Lembro-me da música que tive a felicidade de aprender a tocar e que hoje tento partilhar.
Lembro-me dos abraços e dos beijos que dei e me deram.
Das lágrimas derramdas, das dores.
Lembro-me dos nascer do Sol e das noites quentes de lua cheia, dormidas ao relento debaixo de um céu de estrelas.

Lembro-me de sustos e trovoadas, chuvas e escaldões...
Lembro-me de subir uma montanha de mota... à luz da lua cheia e de me sentar à vista de uma lagoa de fogo a conversar. De viajar à chuva e ao vento e sentir-me ensopado e mesmo assim sorrir como se fosse a melhor viagem do mundo.

Lembro-me de histórias partilhadas em bancos de jardim sobre velhinhos pedintes em terras longínquas que um dia, sem saberem porquê receberam das mãos de uma menina o maior e mais desprendido presente que ela podia dar... tudo!

Lembro-me dos animais que foram meus companheiros de folias e que me ensinaram tanto.

E de de tantas, tantas outras coisas, situações, pessoas, acontecimentos...
Uns recentes, outros nem tanto...

Quando era pequenino, diziam-me que tinha memória de elefante... e hoje sinto-me o maior sortudo por me poder lembrar.

O que tive em menino, de presentes materiais, não tive hoje.
Com a idade, os festejos perderam a importância... os presentes, esses ganharam... mas de outra natureza.

Hoje, sem o saberem, os meus amigos deram-me o maior presente que alguém pode receber.

Deram-me o seu tempo, atenção e carinho.

Zen

domingo, 15 de maio de 2011

Dhonakulhi

Caminhar sozinho numa cidade estranha, sem raízes ou destino, tem o efeito de me tornar mais atento ao que me rodeia. E assim, em "modo de observação", voltei ao café onde dali a pouco tempo o Rasheed me viria buscar de regresso ao aeroporto para a minha última ligação aérea antes do destino final - a ilha de Dhonakulhi.

O receio da comida estranha e potencialmente prejudicial ao meu estômago ocidental levaram-me a optar por uma sandes de atum e uma água engarrafada.

Sentei-me acompanhado do meu caderno, decidido a conhecer um pouco mais deste mundo que, a cada olhar,  abria para mim janelas com novas paisagens humanas.

Sem dúvida que os pequenos pormenores e vivências da vida local constrastam com a minha bitola europeia.
Há aqui uma outra maneira de viver os dias. Apressados, sem dúvida, ou não estivéssemos numa cidade mas, ao mesmo tempo nota-se a dolência característica das terras banhadas por luz, sol e calor. E nisso encontrei semelhanças com o nosso próprio "lusitanismo"... O sorriso tranquilo vem sempre seguido de uma expressão que transmite a falta de urgência... mesmo para as coisas urgentes!
Agora que penso nisso, talvez seja por isso que, terras assim são destinos de férias por excelência - quem vive na azáfama do stress diário precisa da exposição forçada a um ritmo mais lento ou, de outra forma não descansa.

A ociosidade, como em outras sociedades patriarcais, parece ser uma prerrogativa reservada aos homens e por isso, à minha volta no café, não vejo senão homens.
Uma coisa que me chamou a atenção foi que, embora se sentem vários a uma mesma mesa, ao contrário do que acontece nas nossas tascas de aldeia, não se geram "conversas de café"... O convívio presencial é uma falsa imagem. Aqui impera a tecnologia telemóvel. Não consigo vislumbrar uma pessoa em meu redor que não esteja com uma das orelhas ocupadas por um telefone... Falem-me em comodismo numa ilha-cidade com menos de 6 km2...

A hora do vôo aproximava-se e estava na altura de regressar ao aeroporto.
Aí chegado sou informado que houve uma alteração no vôo e que este estava a acabar de sair (?!?!?!)
Aparentemente houve uma emergência médica numa outra ilha e o horário do vôo foi antecipado uma hora.
"Mas avisaram?" "Estamos a avisar as pessoas desde as 6:30h da manhã"...
O meu azar foi que quem recebeu o aviso no resort, se esqueceu de avisar quem estava a tratar da minha viagem... Surpreedente como a presença portuguesa se faz notar tantos séculos depois da nossa passagem por estas paragens.
"E quando é o próximo vôo?"
"Às 2:30h da manhã" !!

Longas horas de espera (mais de 10h!!!) aguardavam-me...

O Rasheed conseguiu-me descobrir um café onde pousei as coisas, pedimos um chá e liguei o computador para poder ligar-me ao mundo.
Durante algumas horas ocupei o tempo a actualizar os amigos que encontrava online mas, ao fim de algum tempo impunha-se uma mudança...
Deambulei pelos recantos da ilha-aeroporto, li, caminhei... observei o vai-vem de pessoas. Turistas do mundo inteiro. Uns a chegar, outros a partir.
Nuns vê-se a alegria estampada num rosto cansado de muitas horas de viagem. A expectativa de umas férias exóticas. Uma lua-de-mel de sonho...
Noutros, a conformismo inevitável de um regresso cedo demais espelha-se sem sombra de dúvidas...
Caminho para trás e para diante, leio mais um bocado. Escrevo algumas anotações... esqueço-me de tirar fotos.

A noite caiu entretanto e o caloroso pôr-do-sol é pontuado aqui e ali, não com gaivotas mas, com a presença de morcegos frugíveros (Pteropus vampyrus) - o maior morcego do mundo, presença normal nestas paragens, conhecidos como "raposa-voadora".

 
(foto: Dave Behrens)

Passado algum tempo, o Rasheed pergunta-me se gosto de comida do Sri Lanka e picante... "Nunca experimentei mas, estou disposto a experimentar, claro!" respondo "mas, calma com o picante."

"Então vem comigo..." diz, sem adiantar mais.

Sou levado por entre os edifícios nas traseiras do aeroporto... até à cantina do staff.
Aí o Rasheed diz-me: "Vais provar este sumo de melancia! É óptimo para aliviar o calor".
Todos os avisos do médico sobre as comidas frescas e dos potencias perigos  para a saúde saltam-me imediatamente à memória.
Imagino algumas desculpas para recusar educadamente o convite tão apetitoso.
Ao mesmo tempo a fome e a vontade de mandar os cuidados às urtigas conjuram como anjos e demónios empoleirados no meu ombro...
Ganham os demónios da fome e a vontade de viver todas as experiências a que tenho direito. Afinal não é todos os dias que somos levados a comer cozinha local com quem sabe onde ir!
O sumo era refrescante como prometido... gelado, doce... e a comida... enfim a comida era muito saborosa.

Cothuroshi foi nome que aprendi. O que era exactamente não sei. Veio com um ovo estrelado em cima do que parecia massa cozinhada com vegetais, caril, canela e outras coisas que não identifiquei.
Os sabores combinavam tão bem, acompanhados pelo sumo que durante alguns minutos, a conversa parou e abandonámo-nos ao simples prazer de comer e saborear. Ainda bem que pedi sem picante, porque mesmo assim fiquei com os lábios a arder. Nós usamos o sal... eles usam o picante em tudo... confesso que, agora, passados alguns meses, começo a entender o apreciar da comida com picante... É toda uma nova paleta de sabores que se abre à descoberta dos sentidos.

Depois do jantar foi-me oferecido um fruto seco - noz de areca (http://en.wikipedia.org/wiki/Areca_nut) - para mastigar. O ritual é simples. Embrulha-se o fruto seco que, é apresentado cortado em fatias, numa folha fresca de betel (http://en.wikipedia.org/wiki/Betel) e junta-se um pé de cravinho. A princípio a boca seca mas, depois um leve sabor mentolado espalha-se e o hálito fica fresco. Um final perfeito para uma refeição. 
Este é um costume muito comum no Sul da Ásia. É normal ver pessoas que mascam este fruto todos os dias e que por isso ficam com as gengivas e os dentes de um tom avermelhado...

Dirigimo-nos a um café para tomar qualquer coisa... Mais uma vez, seguindo o ditado - "em Roma sê romano - deixei-me levar pela curiosidade e vontade de experimentar os costumes locais e por isso pedi o mesmo que os meus anfitriões. Desta vez um chá com leite.


 
Nesta altura o Rasheed pediu-me para tocar um pouco o meu bandolim, pelo que não me fiz rogado e satisfiz-lhe a curiosidade.
A música continua a ser um aglutinador global... mas foi com alguma curiosidade que vi algumas pessoas chegarem-se mais perto para ouvirem. Por momentos esqueci o cansaço de lado e deixei-me levar pelos sons que os meus dedos cantavam.

Mais uns dedos de conversa, umas piadas e mais umas horas passaram.
O tempo de espera estava a chegar ao fim e dali fomos para o check in dos vôos domésticos.
Apenas mais 4 outros passageiros se juntaram áquela hora para o vôo que me levaria para a ilha de Hanimadhoo, onde teria um barco à minha espera para me levar para Dhonakulhi.

Burocracias, tratadas, passaporte visto, bagagem pesada (e que peso... ) e despachada e depois de uma meia hora na sala de espera, embarcámos.
De noite, as Maldivas são um pontuado de luzes, espalhadas aqui que fazem lembrar um céu estrelado invertido.

Por esta altura o cansaço apoderou-se de mim e nem a música que me fazia companhia me manteve acordado.

Acordei ao aterrar.
Uma pista a correr lado a lado com o mar e praticamente à mesma altura que este.
Dali até à saída foram 5 minutos...
Esperava-me a Sandy e a tripulação que me levaria a Dhonakulhi.


Durante a viagem de barco, por entre a conversa, as apresentações e as primeiras impressões, pude apreciar o céu estrelado (desta vez do lado certo).
Estendi o meu braço para fora do barco para apanhar alguns salpicos.
A água do mar era quente, acolhedora. Levei a mão à boca para sentir o sal deste mar...

Depois a chegada, às 4:30h da manhã... dois dias depois de sair de Portugal.

Duas mensagens para sossegar e partilhar o momento e adormeci.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

diário pessoal

Passam dias em que a vontade não vem. Os sentidos enchem-se e transbordam tanto que, afogam as palavras e estas não saem.
Às vezes é fácil escrever... e outras vezes nada que se diga soa a sentido.

Hoje apeteceu um bocadinho. Depois do mergulho um grupo de golfinhos rotadores (Stenella longirostris) surpreendeu-nos na viagem de volta, com os seus saltos e acrobacias. 

Em momentos assim o mundo fica pequenino, limitado ao espetáculo magnífico que a Natureza nos proporciona. O tempo pára e logo em seguida recomeça o tictac frenético dos sentidos e da vontade de partilhar estes momentos com quem faz parte de mim e não está aqui agora.

Perdoem-me o a demora na escrita. Passe o tempo que passar trago-vos sempre presentes. Mas às vezes precisamos do silêncio para nos ouvirmos melhor.

A chuva voltou. Quente, tropical, intensa... vou aproveitar para matar saudades do cheiro a terra molhada.

(imagem retirada de: http://egyfouna.aun.edu.eg/Egyptian_fauna.asp?clearsession=1&search_fd0=491923111512&)

terça-feira, 5 de abril de 2011

Malé (parte 2)

Foram várias as vezes que, desde a chegada, senti uma curiosidade quase infantil que me fazia querer espreitar para lá de cada esquina dobrada e descobrir cada momento desta cidade tão diferente em pessoas e costumes.

Depois de cumpridas as obrigações, fui deixado à solta pela cidade. O Rasheed tinha compromissos familiares e combinámos encontrar-nos dali a umas horas para voltarmos ao aeroporto, onde iria apanhar um vôo para uma ilha mais próxima do meu destino final.

Primeiro fui ao supermercado comprar algumas coisas para levar comigo. Ao mesmo tempo aproveitei para espreitar que produtos podemos encontrar nesta parte mundo...
Entre shampoos, desodorizantes, aperitivos desconhecidos e coloridos, doces e salgados, frutas estranhas, comidas e especiarias fui surpreendido por descobrir que, às vezes,  o nosso mundo pode mesmo ser pequenino...

Como explicar o que senti ao encontrar estes pequenos nadas que, tal como amigos silenciosos, estão sempre presentes e nos adoçam as memórias?

Devo ter sorrido de alguma forma pois as poucas pessoas na loja que se aperceberam do momento, olharam-me e sorriram de volta ao observarem este estranho, parado em plácida contemplação de uma simples prateleira de chocolates.


Se há alturas em que a globalização pode ser reconfortante, esta é uma delas...

Embora já corresse a hora de almoço, o meu corpo, talvez distraído em absorver tudo o que de novo desfilava perante mim, não sentia ainda a necessidade de repôr energias.

Disposto a perder-me um pouco sem destino, caminhei pelas ruas, decidido a ir onde as pernas me levassem.

Os sons e a dinâmica da cidade, não me eram estranhos de todo. Afinal de contas, aqui ou em qualquer lado do mundo, uma capital não deixa de o ser, só por estar rodeada de uma beleza natural digna de postais.

Lojas, restaurantes, mercados, pessoas e trânsito entrelaçavam-se no tecido deste cantinho do mundo.

De passo em passo, dei por mim à porta do museu nacional!
O edifício é novo, com uma arquitectura luminosa. Lá dentro, o fresco do ar condicionado abrigava-me do calor abafado da rua.
Fui informado que não poderia tirar fotografias... tudo bem - pensei - a memória não vive só nas fotografias.

A exposição incluia muitos artefactos locais (muitos feitos em pedra de coral); a maioria ligados aos cultos mas, também ao dia-a-dia. Modelos de barcos locais (os dhonis), peças de roupa e turbantes, espadas, mesas e cadeiras finamente esculpidas, pertencentes aos sultões de várias épocas, vários livros do Sagrado Corão e também uma pequena secção da vida natural (subaquática) que podemos encontrar nestas águas...
A pouca informação disponível e a repetição de peças muito parecidas umas com as outras acabou por se tornar cansativa e ao fim dos três andares de exposição, saí aliviado para o calor.







 Já antes tinha reparado num jardim e foi para lá que me dirigi.



 











O local convidava a uma paragem e depois da visita ao museu, a pausa soube bem.



Um pormenor que, para mim foi inicialmente chocante mas, que depois compreendi, foi o facto de o chão nas ruas estar coberto de coral!! Na verdade, a pedra de coral aqui, é uma matéria prima usada em praticamente todo o lado.








A cidade é pequena e aqui os caminhos vão dar ao mar... mas, até lá chegar não nos podemos esquivar da vida local.






Um avô passeia o seu neto, numa cena bucólica digna de qualquer parque.
De um lado a mesquita; do outro o quartel militar da cidade.

























Mas o mar está já ali, ao fundo da rua e ao redor do mar gira a vida aqui.
Nalguns sítios podemos recordar a presença de outras culturas nestas paragens (portugueses incluídos).

Mais uma paragem e mais umas fotos.
Numa delas... reparo num velhote, com um peixe na mão... mal tenho tempo de apontar e disparar mas, ficou-me a curiosidade.
De onde viria ele? Concerteza do mercado do peixe. "Isto eu quero ver!" Com este objectivo em mente, segui na direcção contrária e cada vez mais os indícios me apontavam que estava no caminho certo...
Não sou estranho a estas incursões em locais fora dos circuitos turísticos da cidade. Desde cedo, por influência dos meus pais, a minha curiosidade foi estimulada para espreitar os cantos mais recônditos e certamente mais interessantes, por oferecerem uma paleta diferente de cores, sabores e imagens.

Após uma breve caminhada a azáfama tão típica dos mercados de peixe abriu-se de par em par e revelou-se.


Deixo as imagens falarem por si.











Mas não satisfeito com esta pequena "prevaricação ao circuito", decidi continuar em frente, já que a cidade se adivinhava mais interessante nesta direcção.
Fui recompensado com mais um mercado. Desta vez as frutas e os vegetais tomaram o lugar das cores e cheiros.

 





Muitas coisas conhecidas, muitas mais, desconhecidas...
A vontade de trincar algumas daquelas frutas, tão apetitosas à vista, teve que ser refreada.
Não me atrevi a experimentar, ainda receoso que o estômago não pudesse acompanhar o desejo.



As horas avançaram sem eu dar por isso, mas o corpo lembrou-me que alguma comida seria bem-vinda. Aproximava-se também a hora combinada para me encontrar com o Rasheed.
Voltei para trás, contrariado e espreitando por cima do ombro, para poder recordar vislumbres daquela parte da cidade que iria manter os seus cantos um segredo para mim.


sexta-feira, 25 de março de 2011

Malé (parte 1)

Ver o dia nascer no mar e no ar foi uma estreia dupla para mim.

Por esta altura, qualquer réstia de cansaço ou sono mal dormido, desapareceu. A expectativa da chegada a Malé sobrepunha-se a tudo.

Em baixo, começava o desfile de atois, ilhas e recifes de águas azul turquesa.

Estava finalmente a sobrevoar as Maldivas.

Não tinha nenhum espelho mas, agora que me lembro, muito provavelmente parecia um miúdo de olhos arregalados, colado ao vidro, a ver passar esta paisagem tantas vezes imaginada em fotografias e filmes...

 A aterragem não tardou. 10 horas depois de levantar vôo na Europa (quase um dia depois de sair de Portugal) pisei finalmente o chão, num outro lado do mundo... 
O calor abafado dos trópicos deu-me as boas vindas.


Foi rápido o processo de imigração, passaportes, recolha de bagagens e passados uns 20 minutos, desembocava no átrio de chegada onde tinha gente à minha espera.

O Rasheed é um "faz-tudo". Trabalha no aeroporto a receber visitantes, angaria clientes para o seu hotel e acompanha-os quando partem. Para além disso ainda é o contacto do centro de mergulho para onde vou e faz a ponte entre a movimentada Malé e a recatada ilha onde vou passar os próximos meses.

O aeroporto fica na ilha contígua e os ferrys partem a cada 10 minutos para Malé.

Antes de vir, recolhi algumas informações sobre as Maldivas. A altitude máxima do país é - espantem-se -  de 2,3 metros!! (são 1200 ilhas, distribuídas por 26 atóis) No entanto, à vista de Malé, facilmente nos poderíamos enganar e julgar-nos numa qualquer cidade continental, tal é a densidade de prédios e construções.
 
A ilha-cidade fervilha de movimento e o meio de transporte ideal é mesmo a scooter cujos exemplares abundam (arrisco-me a dizer) aos milhares, numa área que se estende por (apenas!) 2 kilómetros quadrados.

O Rasheed não foge à regra e levou-me, na sua scooter (claro), para completarmos o processo do visto de trabalho (fotos, análises e Rx, etc.).

O trânsito aqui, ao contrário do que imaginava, não é caótico. 
Aos olhos de um europeu, habituado a seguir regras (muitas vezes descabidas), a fluidez e naturalidade com que esta gente se desloca nos seus veículos, pode comparar-se à que encontramos na multidão residente que encontramos na Rua Augusta. Todos sabem para onde vão, cada um ao seu ritmo e vão se desviando uns dos outros, por onde há espaço para o fazer. 
Sem atropelos e com raras buzinadelas.
É tão natural que é comum ver amigos a conversar enquanto conduzem lado a lado, zigue-zagueando tranquilamente, enquanto cumprem os seus afazeres diários.

domingo, 20 de março de 2011

a viagem (parte 2)

Foi a primeira vez que entrei num avião deste tamanho. Sei que os há maiores mas, impressiona vermos de perto estes gigantes que sulcam os céus a 11.000m de altitude. Não pude deixar de pensar na potência dos 4 enormes motores Rolls Royce que o sustentam. Talvez não volte a sentir o mesmo mas, desta vez marcou-me a sensação de pequenez.

Dirigi-me ao lugar marcado e para minha satisfação dei conta que tinha a fila de 3 bancos por minha conta. "Tanto melhor - pensei - assim posso deitar-me à vontade" (há vantagens em ser do meu tamanho).
De qualquer maneira, as pessoas que semearam os lugares do avião não chegavam para encher metade.

Guardei o bandolim e a mochila. Preparei o livro, o mp3, a cabeça e o corpo e instalei-me para a viagem que agora iniciava.
O meu mundo inteiro bailava no pensamento, rodopiando em mil vontades, desejos e saudades... Por fora tranquilo... por dentro, num desassossego ameno que alimentava a fogueira da minha ansiedade...
Nas próximas 10 horas aquele ia ser o meu cantinho.

Distraí-me com algumas séries e filmes até ao jantar que, não tardou e aproveitei para beber um "bordeaux" francês (meu rico tinto alentejano, onde estás tu quando és preciso?) na esperança de "preparar" a minha noite descansada (leia-se: ver se adormecia melhor).


Enrosquei-me o melhor que pude mas, não sei se pela posição, se pela ansiedade não foi fácil descansar...


 As horas foram correndo tranquilas. E entre passeios pela coxia, idas ao WC, copos de água e mais filmes, fomos atravessando a Europa, entrámos em África e desembocámos no Oceano Índico.
Já íamos a mais de meio quando o dia começou a despontar. Pela frente, as cores do sol espreitavam tímidas, enquanto atrás da asa a escuridão era a regra.


Lá em baixo o Índico estendia-se sem fim à vista...

sexta-feira, 18 de março de 2011

a viagem (parte 1)

 As coisas só ganham o peso da realidade quanto mais próximas estamos delas... e assim foi.
Os últimos dias antes da partida, foram uma mistura de sentimentos e ansiedades dificeis de pôr em palavras.

Por um lado, esta é uma coisa que há muito queria experimentar. Há a excitação da novidade. De sair da rotina forçada dos últimos meses e ir fazer qualquer coisa que me apaixona.
Ao mesmo tempo, porém sinto o nervoso miudinho de caminhar para o desconhecido. Um mundo novo, com pessoas diferentes. Longe do conforto e segurança do meu pequeno quintal pessoal.
Assaltam-me algumas dúvidas - umas plausíveis, outras nem tanto. Tento não lhes dar demasiada importância. Afinal, o tempo dilui as coisas e por mais que queira, nunca serei capaz de prever o futuro. Não se adivinham os dias, nem as pessoas...
Nas últimas noites, passadas no quarto em Lisboa, pensei várias vezes que seriam as últimas horas que ali passaria durante os próximos meses. No meu pequeno casulo.

Antes de ir tentei estar com várias pessoas, para me despedir em condições, passar algum tempo com elas. Levar comigo, expressões, risos e abraços para me durarem o tempo da estadia.
Não o consegui fazer com toda a gente... claro. Aquilo que para nós é prioridade naquele dia, nem sempre o é para outro alguém...
Ficam saudades. Levo saudades.

Entre material e equipamento, roupa e tralhas várias, o saco foi pesado várias vezes até atingir o limite máximo de 31,8Kg!! mas ficou pronto nos dias antes.
Tudo chegou a tempo para ser companhia na viagem - a caixa estanque para a máquina, o flash, a lanterna, o fato (de mergulho) novo, o saco (feito por medida)... enfim. Tudo e todos (ou quase) se alinharam e no final tudo estava pronto.
                                 

 O dia chegou finalmente e levantei-me com uma sensação estranha que não soube identificar mas, que me deixou melancólico.
Nos meus pais notei a preocupação e o "coração nas mãos" que se lhes espelhava nos olhos e tentavam disfarçar entre abraços e conselhos.
No aeroporto as despedidas foram como sempre são... e lá fui eu para a sala de embarque, entregue aos meus pensamentos.
Enquanto esperava, uns últimos telefonemas e mensagens para amigos especiais de quem não tive a oportunidade de me despedir.

Londres estava já ali...

Heathrow, estava em obras e tive que apanhar um autocarro para Gatwick que, espantem-se! também estava em obras... (onde será que já vi isto?)
Check-in feito e entro para as salas de embarque para algumas horas de espera.

No aeroporto, muitos grupos de miúdos portugueses e espanhóis, concerteza a caminho de qualquer intercâmbio.
Um deles, espanhol, ensaia o seu inglês - "how are you?" - quando passo por perto. Respondo-lhe - "bien, y tú?". Fiquei sem perceber se foi maior a desilusão ou o espanto...
 
Dou umas voltas pelos balcões e compro um adaptador para tomadas e cravo uma carga ao meu leitor de mp3. A viagem que se aproxima é longa e não quero arriscar a ficar sem música a meio caminho.
A sensação com que parti de Lisboa continua latente e ainda sem identificar. É então que recebo uma mensagem já inesperada e a tranquilidade instala-se... Efeito estranho este que algumas palavras em certas alturas têm em nós...

Sento-me nos bancos corridos e leio algumas páginas de um livro de viagens, há muito desejado - "Viagens Sentimentais" do Tiago Salazar - um pouco ao estilo dos livros do Gonçalo Cadilhe mas, num tom com que mais me identifico (obrigado Carlos pela sugestão).
Ao meu lado, uma família italiana com uns miúdos a correr de um lado para o outro, super divertidos, espera também a hora de partida.


Finalmente, depois de várias horas, chega a hora de embarcar.
Enquanto espero a minha vez, ainda há tempo para responder a um inquérito sobre os serviços da companhia. Como estou sozinho torno-me um alvo fácil para uma das senhoras que, lesta se apressa a isolar-me como uma das suas "vítimas".
Aceito responder com algum prazer até... as horas sozinho começam a pesar e agradeço aqueles breves momentos de atenção.
Depois... embarco!

quarta-feira, 16 de março de 2011

semana 1


Já passou uma semana desde que aqui cheguei e até agora as coisas têm corrido bem.
A viagem para cá chegar foi um filme mas, acabou por ter as suas vantagens e cheguei inteiro que é o que interessa.

Agora estou na hora de almoço (em PT alguns ainda estão a dormir, outros estarão a acabar de se levantar) mas, mais logo (para vocês será da parte da tarde) vou fazer um pequeno flashback e descrever-vos as peripécias da viagem para cá e as primeiras impressões da ilha, das pessoas com quem estou a trabalhar, os primeiros dias... etc..

Agora deixo-vos a acordar e espero encontrar-vos mais logo.

aquele abraço...